quarta-feira, 10 de agosto de 2011

preto

Foto: Logan White

Era preto: A borda do livro que lia; as rodinhas do banco da manicure; um quarto do velho espanador; algumas de minhas unhas roídas; os potes de tintas; a cordinha do chaveiro de borracha; as toalhas sujas jogadas no chão; o saco da lixeira do banheiro; minha calça colada.
Foto: Logan White

 Era preto: O café quente que me acordava todas as manhãs; a crina do cavalo selvagem; o bigode do senhor que esperava o onibus; o maiô da mulher gorda banhava-se na praia; a última azeitona não comida, o escuro do cinema; os cabelos lisos das índias.

Era preto: A pipa solitária que perambulava no céu azul; os bicos dos peitos de Maria Alice; o nariz e as pontas das orelhas de Tofu, meu cachorro; a cafeteira quebrada esquecida no movel da cozinha; dois dos pontéiros daquele relógio; a calda do bolo de chocolate que me engordava nas férias, as roupas em dias de luto, a eterna distância entre eu e meu pai.

 Foto: Logan White

Era preto: O anoitecer em Ibiapina; o misterioso fundo do mar, o enigma não revelado dos olhos dele; a risada da mulher da casa vermelha; uma única mecha dos cabelos de meu avô, a pequena calçinha usada para seduzir; minha melancolia diária, todos os segundos ausentes de ti.

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